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Desemprego: a epidemia do século XXI



Independentemente do motivo, estar desempregado não é uma situação desejável. Como se já não fossem suficientes as dificuldades económicas – dado que é cada vez mais complexo viver com pouco dinheiro ou sem ele - a sociedade encarrega-se de atribuir uma conotação extremamente negativa ao estado, como se quem não tivesse trabalho fosse um género de criminoso ou um doente, com uma crise aguda de preguicite.


Em novembro de 2018, a taxa de desemprego fixou-se em 6,6%. Pode não parecer muito, a uma primeira instância, mas, sendo que somos cerca de 10 milhões, expressa mais de 672.000 pessoas sem ocupação!


Na Bitten Magazine, estamos atentos a tudo e todos e, desta vez, fomos entrevistar uma pessoa que perdeu o seu emprego e que nos contou o quão difícil foi ver-se novamente inserida num contexto laboral.


- Helena, conte-nos, como era a sua vida profissional, antes de ser despedida?


Licenciei-me em psicologia. Achava que era a minha vocação: lidar com pessoas. Quando terminei os estudos, procurei, durante algum tempo, enquanto trabalhava em lojas, conseguir exercer aquilo a que tanto me tinha dedicado. Não consegui e acabei por desistir.


Depois de muito batalhar, troquei as lojas por um escritório. Recursos humanos. Não era, de todo, o que eu queria, mas ganhava melhor do que no centro comercial. Conformei-me. Conformei-me até ao dia em que fui despedida, passados dois anos.


“Corte orçamental”, disseram-me. Foi um choque. Durante aquele mês, respondi desesperadamente a todo o tipo de anúncios. Consegui algumas entrevistas, mas não voltavam a chamar-me. Comecei a ficar desesperada. No último dia, assim que pisei a rua, senti revolta e medo. Muito medo. O que seria de mim?


- O que foi de si?


Infeliz ou felizmente, ser despedida fez com que tivesse direito a subsídio. Portanto, assim que pude, fui inscrever-me no centro de emprego. Sabia que iria receber uma ninharia, mas era melhor do que nada. Para além disso (achava eu), que por ser a primeira vez que estava na situação, receberia ajuda para, finalmente, carrilar a minha vida.


Poucos dias depois, abri a primeira carta IEFP. Uma convocatória. Uma convocatória, obrigatória, de 3 horas, para que me fossem apresentados cursos. “Oportunidades”, chamaram-lhe eles. Recusar significava ver cortado o apoio financeiro que ainda nem sequer tinha recebido. E lá fui.


Percebi que os cursos que me estavam a ser apresentados nada tinham a ver com a minha profissão e eram ofensivamente básicos. No entanto, os oradores discursavam orgulhosamente, enquanto vendiam o seu produto, colocando-nos numa situação de inferioridade. Eram rudes e pretensiosos.


Convocam licenciados e acham que as pessoas não sabem que estes cursos, oferecidos ‘generosamente’ por grandes marcas, não passam de mais um golpe de marketing, de um conjunto de partes envolvidas, que estão tudo menos preocupadas com o futuro das pessoas? Chateou-me. Bastante.


Fui convocada mais umas quantas vezes, para o mesmo, através de diversas cartas, todas elas escritas no mesmo tom ameaçador. Caso não comparecesse, o subsídio era cortado. Com que direito, pergunto eu? Com que direito andamos a descontar uma grande parte do nosso salário para estas eventualidades e depois negam-nos o acesso ao que é nosso por direito, fazendo usufruto dos nossos dados para golpes comerciais?


É ridículo! Fazem-nos passar por ridículos. Já para não falar que tinha de me deslocar de carro para locais aos quais não conseguia chegar de transportes e, mesmo que assim fosse, teria de gastar imenso dinheiro, como acabei por gastar em gasolina, estando com os tostões contados.


O estigma do desempregado faz com que muitas pessoas se sujeitem a situações que as rebaixam enquanto seres humanos, quer seja nas que referi, quer seja em entrevistas.


Já dei comigo a justificar-me, vezes sem conta. A justificar o meu desemprego, a praticamente implorar que me contratassem, como se me estivessem a fazer um favor, a sujeitar-me a um ordenado que não é digno e com o qual aquelas pessoas, que me estavam a entrevistar, certamente não conseguiriam viver. Quem se preocupa com isso? A resposta é: ninguém!


Neste momento, estou a trabalhar. Numa loja, novamente. Foi o que consegui pelos meus meios. Não perdi a esperança de ter um futuro brilhante, onde possa fazer a diferença e ajudar realmente os outros. Apenas eu sei o meu valor, pois terceiros leem rótulos.


- Que conselho quer deixar a quem esteja a passar pela situação que passou?


Que se valorizem e que lutem pelo que querem. Que não se deixem embalar pelas cantigas que nos sussurram aos ouvidos. Que procurem sempre a justiça. Que não desistam. Eu ainda não desisti.


Infelizmente conheço imensas pessoas que estão a passar pela dificuldade que é encontrar um trabalho. E mantê-lo. Isso também é um problema, dado que hoje não se valorizam os trabalhadores. Somos números. Umas vezes somamos, noutras somos subtraídos.


O desemprego é, realmente, uma epidemia, cujos sintomas são amenizados com mezinhas. A cura ainda ninguém a descobriu. Porquê? Porque não interessa. Interessa que andemos feridos, descentrados, cabisbaixo, sem poder. Porque quem pode muda e a mudança assusta todos aqueles que receiam perder o controlo.


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